Lembro bem quando esta pergunta foi dirigida a mim, que na época tinha 6-7 anos. E lembro melhor ainda da minha resposta. Olhei bem nos olhos do meu interlocutor e respondi com orgulho: "Eu vou ser professora!". Quando a pessoa tentou me corrigir dizendo que professor não ganhava bem, eu respondi sem pestanejar: "Eu não quero ser professora por causa do dinheiro. Eu quero ser professora porque eu gosto." Com o tempo, minhas escolhas mudaram. Quis ser escritora, jornalista, publicitária, psicóloga, médica... Tornei-me bióloga, pesquisadora, educadora ambiental e (quem diria - ainda bem que a vida dá voltas) professora. Não, a realidade de um professor aqui nos EUA não é diferente da realidade de um professor no Brasil (considerando os devidos padrões, é claro). Aqui, um professor ainda ganha pouco e trabalha muito. É um profissional pouco reconhecido e muito exigido. É preciso mesmo ter o dom de ensinar para ser professor, pois é muito fácil esquecer o compromisso real e fazer foco apenas na parte ruim. Hoje eu quero SER PROFESSORA.
Quando olhei no calendário de atividades programadas pela colônia de férias do Kiyo, vi que hoje (sexta-feira, 13 de julho) seria o dia dedicado à carreira futura / profissão. E a tal pergunta voltou a fazer parte dos meus pensamentos: "O que meu filho quer ser quando crescer?" Perguntei a ele, que prontamente me respondeu: "I want to be Spiderman" (eu quero ser o Homem Aranha). Expliquei a ele que uma profissão é diferente de ser "super herói". Que o próprio Peter Parker tinha uma profissão. Ele é sim o Homem Aranha, mas esse é o seu super poder. E que ele trabalha em um jornal como fotógrafo e repórter. Daí contei para ele o que cada uma das pessoas que ele conhece fazem como profissão. Expliquei, do meu jeito, que eu sou mãe (meu super poder), mas que minha profissão é pesquisadora-professora.
Então ele teve uma idéia: "Mamãe, eu vou ser um doutor de animais." E eu perguntei: "você quer ser um doutor que estuda animais (como o Dr. Wetterer - meu orientador que ele conhece bem) ou você quer ser um doutor que cuida de animais?" E ele: "um doutor que cuida de animais." E eu: "Ah, você quer ser um vet." E ele: "Sim, eu quero ser um VET!". E assim dormimos a noite. Hoje pela manhã, peguei meu jaleco e comecei a dobrar a manga para que ele pudesse usar e ser o doutor de animais. Então ele me contou: "Mamãe, eu quero ser o Buzz Lightyear!" Pensei, pensei e pensei... Até que entendi: Kiyo poderá ser aquilo que ele quiser (como disse anteriormente), e hoje ele precisa apenas se preocupar em ser criança.
A sociedade em geral tenta moldar as pessoas desde muito cedo para seguirem esta ou aquela profissão no futuro. Conheço pessoas que estudaram por anos para serem doutores e engenheiros para satisfazer um sonho que na verdade nem deles era. E isso os transforma em profissionais ruins, deprimidos com suas "escolhas". No final das contas, a própria sociedade paga a conta por essa pressão desnecessária para que nossas crianças professem ainda tão cedo o que eles "querem" ser. E quando o que eles querem ser não confere com o que é "desejável", críticos franzem a testa e se acham no direito de opinar. De verdade, porque uma criança de 5 anos precisa dizer o que vai ser quando crescer?
Quando o Kiyo foi questionado sobre sua escolha de ser Spiderman, ele logo achou uma maneira de se enquadrar no que era apropriado para mim e disse que queria ser um doutor de animais. Hoje pela manhã, quando ele cismou em ser o Buzz, eu confesso que relutei um pouco. Tentei novamente explicar as profissões. Até que me flagrei do que eu estava fazendo e apenas concordei. Kiyo é criança. Deixe que ele seja criança! Entrando no carro, com a roupa do Buzz Lightyear dentro da sacola, eu olhei para meu pequeno Space Ranger - Super Herói e disse em seu ouvido: "Kiyo, você é o meu Super Herói favorito!".
Chegando na escola, vimos os coleguinhas vestidos de médicos, bombeiros, soldados, cantores e mergulhadores... Kiyo colocou sua roupa de Buzz e disse todo feliz: "I will be a Space Ranger!"
Hoje ele me ensinou mais uma lição: deixe a criança ser criança e equipe-a de forma com que ela possa realmente ser aquilo que quiser.